Os filósofos da natureza, naquele momento,
dialogavam com os poetas e com os profetas judaicos. Os poetas eram os
responsáveis pela fundamentação dos mitos, segundo eles, eram inspirados pelos
deuses e por isso deviam ser cridos que suas poesias eram a verdade. Os
profetas dos judeus, diferente dos poetas, fundamentavam sua fé na palavra
revelada por Deus, o criador do Universo, por isso, eram monoteístas (fé num
único Deus). A filosofia nasceu para contestar essas fontes de verdades; queriam
eles, pela observação e na capacidade sensível de investigação da natureza e do
cosmos, ser capaz de, independente de crenças mitológicas e revelações
proféticas, construir um conhecimento legitimamente humano, antropocêntrico.
Heráclito de Éfeso (VI e V a. C.) e sua irracionalidade
Heráclito foi o primeiro a entrar em crise
existencial filosófica. Para ele é impossível apreender coisa alguma para
analisá-la, pois tudo está em movimento, nada está estático na Terra e no
Universo, pior, tudo é um constante ser e não ser, logo, tudo é contradição. O
que é gerado corrompe-se (tudo que nasce morre), logo, apreender o que do
Universo se tudo é movimento ilusório? Heráclito foi o primeiro a descrer do
projeto filosófico naturalista. Ele e a filosofia eram obscuros e contraditórios,
logo, irracionais.
Parmênides de Eléia (VI e V a. C.)
A Physis (filosofia da natureza)
entrou em crise; nenhum elemento natural foi encontrado para ser o princípio da
criação; o Deus dos judeus apresentou-se indestrutível, como também seu
opositor, o politeísmo mitológico. Então, o que restou a filosofia? Como diz o
ditado: “se não pode vencê-los, une-se a eles”. E foi esta a saída que Parmênides encontrou
para construir sua ontologia (teoria do ser). “Parmênides põe a doutrina do seu
poema na boca de uma deusa que o acolhe benignamente. Ele imagina ser levado à
deusa puxado por velozes cavalos e em companhia das filhas do sol: alcançando
primeiro o portão que leva às sendas da noite e do dia, convencem a justiça,
severa guardiã, a abri-lo e depois, ultrapassando a marca fatal, é guiado até a
meta final”.
A deusa (que, sem dúvida, simboliza a
verdade que se revela), no fim do prólogo, diz de modo solene e programático:
“É preciso que aprendas tudo: 1)
da verdade robusta o sólido coração; 2) e dos mortais as opiniões, em que não
há certeza veraz; 3) ademais, também isto aprenderás: quem, em todos os
sentidos, tudo indaga precisas admitir a existência das aparências”. (Giovanni
Reale\Dario Antiseri. História da filosofia, vol. I; pág. 50. Ed. Paulus, 1990)
A partir do princípio
mítico-místico, Parmênides, fazendo uso da racionalidade como fazem os poetas,
redireciona o “racionalismo” filosófico. Então, acaba naquele momento o projeto
primeiro da filosofia de construir um conhecimento antropocêntrico, mas o
desafio de suplantar o Deus bíblico estava e continua vivo, só que, doravante,
unidos ao misticismo. E assim, Parmênides mostra o princípio de sua verdade
filosófica: “o ser é e não pode não ser; o não ser não é e não pode ser de modo
algum”. “É necessário dizer e pensar que o ser seja: com efeito, o ser é; o
nada não é”. “Um só caminho resta ao discurso: o que o ser é”. “Ser” e “não
ser” são tomados em seu significado integral e unívoco (que se aplica a muitas
coisas do mesmo gênero, com o mesmo sentido, ainda que distintas): “o ser é
positivo puro e o não ser é negativo puro, um é absoluto contraditório do outro”.
E assim, de mãos dadas, filosofia e mitologia encontraram uma saída para continuar
no seu projeto de anulação do pensamento bíblico e da fé num Deus que tudo
criou e que quer salvar. Então,
conclui-se, que, Parmênides de Eléia, foi o primeiro filósofo idealista. Por
que idealista? Porque com o fim da busca de um elemento natural para a gênese
do Universo e da vida, ele deslocou o foco da physis (natureza) para as
ideias, o discurso lógico coerente.
Sócrates (470/469-399 a. C.)
O pai de Sócrates era escultor e sua mãe
parteira. Sócrates não escreveu nenhum tratado filosófico, tudo que sabemos
dele veio através de seus admiradores e discípulos, principalmente o destacado
filósofo Platão. Apesar de ser contemporâneo de Parmênides e Heráclito, não foi
influenciado por nenhum deles. Percebendo o fim da filosofia da Physis
e suas complicações, criou seu próprio método filosófico: a “maiêutica“,
assim, indagando seus interlocutores mostrava-lhes que nada sabiam do
que diziam saber. Por isso sua máxima filosófica: “Conhece-te a ti mesmo”.
Sócrates ignorou a investigação da natureza e a mística teoria do ser de
Parmênides, voltando-se a psique (psicologia), dispôs-se a entender o homem e
sua moral política e religiosa. As ruas e as ágoras (praças públicas) eram
seu palco para conscientizar seus contemporâneos das injustiças políticas e da
inutilidade dos deuses mitológicos. Os jovens estavam entendendo o discurso
filósofo ambulante; incomodados, os líderes políticos e os sofistas
(professores que cobravam para ensinar) resolveram silenciar o
revolucionário filósofo das ruas. Levado à corte de Atenas foi condenado à
morte; teve oportunidade de fugir e foi aconselhado a sair da cidade, porém,
para ser coerente à sua moral, crença e filosofia, democraticamente tomou o
copo de cicuta e morreu após a paralisação de seus órgãos vitais. Sócrates
acreditava num único Deus “Inteligência superior” e, creio eu,
esse Deus deu-lhe forças para suportar as injustiças por sua coerência aos
ideais morais, religiosos e filosóficos; por isso não vacilou diante do
martírio. Diz Platão: “o homem mais justo de seu tempo foi condenado à morte
sob a acusação de impiedade e de corrupção da juventude”. Sócrates, primeiro marte da filosofia.
Filósofo Isaías Correia Ribas